domingo, 17 de fevereiro de 2013






O LIVRO

Naquele quente dia de verão a Inês sentou-se debaixo da sua árvore favorita do jardim para ler.

Sentia-se confortável à sombra mas não estava muito concentrada no que lia. Distraía-se por tudo e por nada. A leve brisa que agitava a árvore lá no fundo, as formigas que passavam em carreiro a rasar os seus pés,
os pássaros a cantar, enfim, tudo servia para a distrair.

No fim do primeiro capítulo fez uma pausa para se refrescar. Bebeu uma limonada e regressou ao sítio da leitura. Pegou no livro mas já não se lembrava muito bem do que tinha lido e voltou umas páginas atrás.
As palavras não estavam lá. As páginas que tinha lido estavam em branco. O que leu desapareceu como se os seus olhos tivessem apagado as palavras.
Olhou dezenas de vezes para a capa. O livro era o mesmo, aquele que ela tinha pegado ao acaso da estante.

Ainda que muito intrigada resolveu continuar a ler. Fez um esforço para se concentrar e agarrar a história.

Uma hora depois, pousou o livro na cadeira e foi esticar as pernas numa breve caminhada. Voltou muito curiosa para ver se todas as palavras lidas tinham sido comidas sabe-se lá por quem.
Abriu o livro e viu que todas as folhas lidas esbranquiçaram, nem uma letra, nem ponto, nem vírgula.

Ler o livro até ao fim passou a ser o seu único objectivo. Tinha de terminar de o ler o mais rápido possível para descobrir se o livro se iria transformar no livro branco.

No dia seguinte quando leu a última palavra sentiu um baque no coração, não pela história em si mas pelo quão misterioso era aquele livro que tinha deixado fugir as palavras.
Inês pousou o livro na cadeira e foi dar um breve passeio pelo jardim.




Quando voltou sentou-se, fechou os olhos e reclinou-se para trás. Minutos depois abriu os olhos lentamente e viu as palavras do livro penduradas nos ramos da árvore.

As páginas do livro estavam todas brancas.

As palavras penduradas e a árvore estavam felizes como nunca. Dançavam ao sabor do vento. Brilhavam com a luz do sol.
Já não estavam encarceradas e apertadinhas entre as folha de um livro dependentes da vontade de um leitor.
Agora eram livres e continuavam a ser palavras.

Quem sabe, um dia, voltariam ao seu livro.

M.
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